Art. 180 - Adquirir, receber,
transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe
ser produto de crime (receptação
propriamente dita), ou influir
para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte (receptação imprópria):
Pena - reclusão,
de um a quatro anos, e multa – R(1-4 anos)
Receptação
Qualificada
§ 1º - Adquirir, receber,
transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar,
vender, expor a venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou
alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial,
coisa que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8
(oito) anos, e multa. – R(3-8
anos)
§ 2º - Equipara-se à atividade
comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em
residência.
Receptação Culposa
§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre
o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se
obtida por meio criminoso:
Pena - detenção,
de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas. D(1m-1a) e/ou multa
§ 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena (uma
escusa absolutória, por exemplo) o autor do crime de que proveio a coisa.
§ 5º - Na hipótese do § 3º, se o
criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena (perdão judicial). Na receptação dolosa, aplica-se o disposto
no § 2º do art. 155 (§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno
valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de
detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.). S (R->D) ou <1/3 a 2/3 ou multa
§ 6º - Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União,
Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de
economia mista, a pena prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro. (2X)
- As novas condutas :
Vieram suprir uma lacuna que deixava impunes as condutas daqueles que
"atravessavam" a res furtiva
, do ladrão ao efetivo receptador, porque inviabilizava ou, pelo menos,
dificultava a caracterização do estado de flagrância de tais condutas. Isto
porque, na redação original, as figuras típicas "adquirir" e
"receber" só permitiam estado flagrancial, propriamente dito, se os
agentes fossem presos no momento em que se apossavam da res furtiva. A
tradicional figura "ocultar" pressupõe a dissimulação, o que muitas
das vezes não ocorre, já que a receptação é ostensiva.
- "Transportar" e
"conduzir" : Com essas novas condutas, está em
flagrante-delito aquele que leva consigo a res
furtiva, da mesma forma em que está aquele que a "adquire",
"recebe" ou "oculta". Aí se incluem os motoristas que estão dirigindo o carro roubado, que estão levando
nos caminhões as peças roubadas, etc. Essas novas condutas abrangem uma grande
parcela de receptadores, igualando os
"atravessadores" aos efetivos receptadores.
- Condutas permanentes :
De se notar que as condutas "transportar"
e "conduzir" são permanentes, protraindo-se no tempo o momento
consumativo, com sua conseqüência flagrancial. Enquanto durar o deslocamento da
res furtiva está sendo cometida a
infração penal.
- "Transportar" X
"conduzir". Diferenças : "Transportar" significa deslocar de um local de
origem para um outro local de destino; "Conduzir" é menos do que
"transportar", ao passo em que basta, para sua caracterização, ter o
agente a res furtiva , em trânsito,
em seu poder. Se se tratar de veículo, por exemplo, basta que o agente o
esteja dirigindo, sabendo ser o veículo produto de crime. Esta conduta
parece-nos vir sob encomenda para as famosas "cabras" (veículos roubados ou furtados que alguns policiais,
os quais deveriam formalizar a recuperação e entregá-los aos seus
proprietários, utilizam como se fossem seus).
- Receptação imprópria :
O legislador, ao criar as
novas condutas da receptação, o fez apenas para a chamada "receptação
própria", esquecendo-se da "receptação imprópria" (2ª
parte, do caput do art. 180). Assim, o crime formal de receptação imprópria ocorre somente quando há intermediação para
que terceiro de boa-fé "adquira", "receba" ou
"oculte" a res , inexistindo, porém, quando há intermediação para o
"transporte" ou "condução", o que se constitui em
incoerente esquecimento do legislador.
- Receptação qualificada (§
1º) : A qualificadora se dá em razão do exercício de atividade
comercial ou industrial, por parte do sujeito ativo da relação criminal,
relacionada à receptação. Não é
necessária a atividade comercial regular, posto que a ela se equipara qualquer
atividade de comércio, ostensiva ou clandestina, mesmo irregular, ainda que
exercida em residência (§ 2º) .
. Condutas :
Além das cinco condutas que caracterizam a receptação simples, a se
distinguirem em razão da atividade, na forma acima vista, o legislador tipifica
outras sete - "ter em depósito",
"desmontar", "montar", "remontar",
"vender", "expor a venda", "utilizar"
de qualquer forma.
De se notar que o simples uso da res
furtiva configura a receptação qualificada.
As condutas de " ter
em depósito " e " expor a venda " são permanentes , com suas
conseqüências processuais quanto ao estado de flagrância se protraindo no
tempo, capaz de autorizar o ingresso em "casa" alheia (art. 150, §
4º, do Código Penal) independente de mandado judicial (art. 5º, XI, da
Constituição Federal).
. Elemento
subjetivo : É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de
praticar uma das doze condutas da receptação qualificada, para levar vantagem
(proveito próprio ou alheio), no exercício de atividade comercial (própria ou
equiparada) ou industrial, tendo por
objeto material coisas que " deve saber ser produto de
crime".
Aqui
o legislador não exige o conhecimento da origem do material como imprescindível
ao dolo do receptador, como o faz na receptação simples (coisa que " sabe ser
produto de crime").
Enquanto que, na
receptação simples, em razão da exigência do conhecimento da origem da res,
tem-se entendido que só o dolo direto é capaz de caracterizá-la (RF, 192:382; RT
486:321, 495:353, 517:362; JTACrimSP, 51:207...), aqui, na receptação
qualificada, tanto faz se o agente obrar com dolo direto como com dolo eventual,
interpretação que nos parece condizente com a expressão " deve
saber ser produto de crime".
A diferença de tratamento é bem
razoável, ao passo em que a receptação
qualificada pressupõe o exercício de atividade comercial ou industrial, sendo
perfeitamente exigível do comerciante ou industrial um dever maior de cuidado,
de sorte a não assumir riscos de trabalhar com produtos de crime.
. Destinatários
das novas figuras típicas : Examinando o tipo qualificado da
receptação, tem-se a nítida impressão de que veio, sob encomenda, para os proprietários de "ferros-velhos"
e outros locais de "desmanche"
de veículos onde, até então, se realiza impune o comércio de carros e peças
de automóveis roubados (entrando o carro por uma porta e saindo suas peças pela
outra), bem como para os "feirantes"
das famosas feiras de peças de carros roubados, sendo conhecidíssima no Rio de
Janeiro a "Feira de Acari", tema, inclusive, de música, em ousada
apologia ao crime.
- Receptação culposa (§ 3º) :
Permanece punível, à título de culpa, as condutas de quem "adquire" ou "recebe" coisa que " deve presumir-se obtida por meio
criminoso". Aqui o legislador, ao contrário do que normalmente faz (art.
18, II, do Código Penal), descreve o tipo penal culposo, revelando a
imprudência pela desproporção entre o preço cobrado e o preço de mercado da res ,
bem como pela pessoa do vendedor, e, ainda, pela natureza incompatível com a
forma de negociação da coisa. Apenas a
aquisição e o recebimento são incriminados à título de culpa. Não o é (como já não o era) a
ocultação, isto porque, como ensina Damásio de Jesus (Código Penal
Anotado, ed. Saraiva), tal
conduta revela o dolo. Também não o são as demais condutas (transportar, conduzir, etc.),
porém por mera política legislativa, já que as mesmas, em tese, admitiriam
idêntica descrição culposa.
- Receptação privilegiada (§
5º, parte final) : Com certeza gerará controvérsias, a respeito da
aplicação do privilégio apenas à
receptação simples ou, também, à receptação qualificada, já que ambas são
dolosas e a lei utiliza, genericamente, a expressão "Na receptação
dolosa aplica-se o disposto no §
2º do art. 155. O legislador deveria ter esclarecido, e não apenas
renumerado o parágrafo (de § 3º, para § 5º), já que criou outra figura de
receptação dolosa - a receptação qualificada - que, antes, não existia.
Contudo, a NOSSA POSIÇÃO é a seguinte: o privilégio da substituição da
pena de reclusão pela de detenção, sua redução de um a dois terços, ou a
aplicação exclusiva da pena de multa, quando primário o criminoso e de pequeno
valor a res , só tem cabimento em face de receptação simples, não
se aplicando à receptação qualificada , porque incompatível com a mens
lege , que foi a de agravar a situação daqueles que, em exercício de
atividade comercial ou industrial, trabalham com produto de crime.
- Receptação de bens
públicos (§ 6º) : De se notar que houve, apenas, modificação da
escala penal, que era própria (reclusão de um a cinco anos e multa), passando,
agora, a pena a ser a da receptação simples, dobrada (o que dá reclusão de dois
a oito anos e multa).
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