Márcio André Lopes Cavalcante*
Foi recentemente publicada a Lei n.° 12.683/2012, que altera a Lei
de Lavagem de Dinheiro para tornar mais eficiente a persecução penal no caso
desses crimes.
Vamos aprender sobre essa importante novidade legislativa, conhecendo
antes um pouco mais a respeito do crime de lavagem de dinheiro.
Antecedente histórico da Lei n.° 9.613/98
|
A comunidade internacional chegou à conclusão de que o combate a
determinados tipos de criminalidade, como o tráfico de drogas e o crime
organizado, somente pode ser feito de forma eficaz se houver medidas estatais
que persigam o lucro decorrente desses crimes.
Desse modo, a criminalização da lavagem de dinheiro está diretamente
relacionada com o combate ao tráfico de drogas, ao crime organizado, aos
crimes contra a ordem tributária, aos crimes contra o sistema financeiro, aos
crimes contra a administração pública e a outros delitos que geram para seus
autores lucros financeiros.
O objetivo, portanto, é o privar as pessoas dedicadas a certos crimes
do produto de suas atividades criminosas e, assim, eliminar o principal
incentivo a essa atividade.
Nesse contexto, o Brasil assinou um tratado internacional no qual se
comprometeu a reprimir a lavagem de capitais. Trata-se da chamada Convenção
de Viena:
Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substância
psicotrópicas (Convenção de Viena)
Assinada em Viena, em 20 de dezembro de 1988.
Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto 154/1991.
Estabeleceu que os países signatários deveriam adotar medidas para
tipificar como crime a lavagem ou ocultação de bens oriundos do tráfico de
drogas.
|
|
Origem da expressão “lavagem de dinheiro”
|
O termo “lavagem de dinheiro” surge nos EUA, sendo lá chamada de
“money laundering”.
A origem do termo remonta a cidade de Chicago, na década de 20, quando
vários líderes do crime organizado abriram lavanderias de fachada nas quais
superfaturavam os lucros a fim de justificar seus ganhos ilícitos e seu
padrão de vida. Os criminosos, portanto, lavavam pouca roupa, mas muito
dinheiro.
Outras terminologias adotadas no mundo:
Em alguns países da Europa o crime de “lavagem de dinheiro” é
conhecido como “branqueamento de capitais”, o que não é uma terminologia
adequada considerando que poderia gerar discussões sobre eventual concepção
racional preconceituosa.
|
Conceito de lavagem de dinheiro
|
Lavagem de dinheiro é...
- a conduta segundo
a qual a pessoa
- oculta ou
dissimula
- a natureza,
origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade
- de bens, direitos
ou valores
- provenientes,
direta ou indiretamente, de infração penal
- com o intuito de
parecer que se trata de dinheiro de origem lícita.
Em palavras mais simples, lavar é transformar o dinheiro “sujo”
(porque oriundo de um crime) em dinheiro aparentemente lícito.
|
Lei n.° 9.613/98
|
No Brasil, a tipificação e os aspectos processuais do crime de lavagem
de dinheiro são regulados pela Lei n.° 9.613/98.
A Lei n.° 12.683/2012 alterou a Lei n.° 9.613/98
para tornar mais eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de
dinheiro.
|
Art. 1º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de
crime:
I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II - de terrorismo;
II – de terrorismo e seu financiamento;
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material
destinado à sua produção;
IV - de extorsão mediante sequestro;
V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou
para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou
preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
VI - contra o sistema financeiro nacional;
VII - praticado por organização criminosa.
VIII – praticado por particular contra a administração pública
estrangeira (arts. 337-B, 337-C e 337-D do Decreto-Lei n.° 2.848, de 7
de dezembro de 1940 – Código Penal).
Pena: reclusão de três a dez anos e multa.
|
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores
provenientes, direta ou indiretamente, de
infração penal.
O rol de incisos foi revogado.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
|
Crime antecedente
O delito de lavagem de dinheiro é previsto no art. 1º, da Lei n.° 9.613/98.
A lavagem de dinheiro é classificada como um crime derivado, acessório ou parasitário,
considerando que se trata de delito que pressupõe a ocorrência de uma infração
penal anterior. A doutrina chamava essa infração penal anterior de “crime
antecedente”.
A lei alterada afirma que a lavagem de dinheiro depende de uma infração
penal antecedente. Infração penal é um gênero que engloba duas espécies: crime
e contravenção. Logo, a lavagem depende agora de uma “infração penal
antecedente”.
INOVAÇÃO 1:
ANTES: somente havia lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação
fosse de bens, direitos ou valores provenientes de um crime antecedente.
AGORA: haverá lavagem de dinheiro se a ocultação ou dissimulação for de
bens, direitos ou valores provenientes de um crime ou de uma contravenção
penal. Desse modo, a lavagem de dinheiro continua a ser um crime derivado, mas
agora depende de uma infração penal antecedente, que pode ser um crime ou uma
contravenção penal.
Importância no caso do “jogo do bicho”:
O chamado “jogo do bicho” não é previsto como crime no Brasil, sendo
considerado apenas contravenção penal tipificada no art. 51 do Decreto-Lei n.° 3.688/1941.
Logo, os chamados “bicheiros” ganhavam muito dinheiro e, com essa
quantia, compravam imóveis e carros em nome da esposa, parentes, amigos, que
funcionavam como “laranjas” ou então abriam empresas de fachada apenas para
“esquentar” as quantias recebidas com a contravenção penal. Tal conduta de
ocultação ou dissimulação do dinheiro “sujo” passa somente agora a ser punida
como lavagem, nos termos do novo art. 1º da Lei n.° 9.603/98.
Gerações das legislações sobre lavagem de dinheiro
Como vimos, a lavagem de dinheiro sempre pressupõe uma infração penal
antecedente.
Qual é essa infração penal antecedente?
Isso vai variar de acordo com a legislação de cada país.
Alguns países preveem um único crime como antecedente, outros trazem uma
lista de delitos e há ainda aqueles que estabelecem que a ocultação ou
dissimulação dos ganhos de qualquer infração penal pode configurar lavagem de
dinheiro.
Com base nessas diferenças entre as diversas leis, a doutrina construiu
a ideia de que existem três “gerações” de leis sobre lavagem de dinheiro no
mundo:
Primeira geração:
São os países que preveem apenas o tráfico de drogas como crime
antecedente da lavagem.
Recebem a alcunha de primeira geração justamente porque foram as
primeiras leis no mundo a criminalizarem a lavagem de dinheiro.
Somente previam o tráfico de drogas como crime antecedente porque foram
editadas logo após a “Convenção de Viena” que determinava que os países
signatários tipificassem como crime a lavagem ou ocultação de bens oriundos do
tráfico de drogas.
Segunda geração:
São as leis que surgiram posteriormente e que, além do tráfico de
drogas, trouxeram um rol de crimes antecedentes ampliando a repressão da
lavagem.
Como exemplos desse grupo podemos citar a Alemanha, Portugal e o Brasil
(até a edição da Lei n.°12.683/2012).
Terceira geração:
Este grupo é formado pelas leis que estabelecem que qualquer ilícito
penal pode ser antecedente da lavagem de dinheiro.
Em outras palavras, a ocultação ou dissimulação dos ganhos obtidos com
qualquer infração penal pode configurar lavagem de dinheiro.
É o caso da Bélgica, França, Itália, México, Suíça, EUA e agora o Brasil
com a alteração promovida pela Lei n.° 12.683/2012.
Desse modo, vamos sintetizar essa inovação:
INOVAÇÃO 2:
ANTES: a lei brasileira listava um rol de crimes antecedentes para a
lavagem de dinheiro fazendo com que o Brasil, segundo a doutrina majoritária,
estivesse enquadrado nas legislações de segunda geração.
AGORA: qualquer infração penal pode ser antecedente da lavagem de
dinheiro. A legislação brasileira de lavagem passa para a terceira geração.
Análise crítica dessa mudança
Um dos maiores especialistas sobre lavagem de dinheiro no Brasil, o juiz
federal Sergio Fernando Moro, ainda analisando o projeto que veio a ser
aprovado, assim se manifestou sobre a mudança:
“A eliminação do rol apresenta vantagens e desvantagens. Por um lado
facilita a criminalização e a persecução penal de lavadores profissionais, ou
seja, de pessoas que se dedicam profissionalmente à lavagem de dinheiro. (...)
Por outro lado, a eliminação do rol gera certo risco de vulgarização do crime
lavagem, o que pode ter duas consequências negativas. A primeira, um apenamento
por crime de lavagem superior à sanção prevista para o crime antecedente, o que
é, de certa forma, incoerente. A segunda, impedir que os recursos disponíveis à
prevenção e à persecução penal sejam focados na criminalidade mais grave.
(...)” (Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 36).
Importância no caso de organizações criminosas:
A Lei n.° 9.603/98 previa, em sua redação
original, que ocultar ou dissimular bens, direitos ou valores provenientes de
crimes praticados por organização criminosa configurava lavagem de dinheiro.
Ocorre que a 1ª Turma do STF entendeu que para que a organização
criminosa seja usada como crime antecedente da lavagem de dinheiro seria
necessária uma lei em sentido formal e material definindo o que seria
organização criminosa, não valendo a definição trazida pela Convenção de
Palermo. Decidiu também a 1ª Turma que o rol de crimes antecedentes que era trazido
pelo art. 1º da Lei 9.613/98 (em sua redação original) era taxativo e não fazia
menção ao delito de quadrilha (HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio,
12.6.2012).
Em suma, se um grupo estável de quatro pessoas, formado para a prática
de crimes, realizasse, por exemplo, vários estelionatos e, com isso,
arrecadasse uma grande quantia em dinheiro que seria dissimulado por meio do
lucro fictício de empresas de fachada, tal conduta não seria punida como
lavagem de capitais.
Com a alteração trazida pela Lei n.° 12.683/2012, para os casos
posteriores à sua vigência, não é necessário mais discutir se existe ou não
definição legal de organização criminosa no Brasil considerando que, como
visto, o dinheiro “sujo” obtido com qualquer crime, se for ocultado ou dissimulado,
configurará delito de lavagem de capitais.
Perde, assim, relevância a longa e acirrada discussão se era válida ou
não a definição de organização criminosa estabelecida pelo Decreto 5.015, de 12
de março de 2004, que promulgou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime
Organizado Transnacional - Convenção de Palermo.
Esse debate terá ainda importância apenas nos casos anteriores à Lei n.° 12.683/2012
que, neste ponto, não é retroativa por ser lei penal mais gravosa.
Art. 2º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
(...)
II - independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes
referidos no artigo anterior, ainda que praticados em outro país;
|
Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei:
(...)
II - independem do processo e julgamento das infrações penais
antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos
nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento;
|
Comentários:
Para que seja recebida a denúncia pelo crime de lavagem, deve haver, no
mínimo, indícios da prática da infração penal antecedente.
Registre-se que não se exige condenação prévia da
infração penal antecedente para que seja iniciada a ação penal pelo delito de
lavagem de dinheiro.
Por essa razão, o julgamento da infração penal antecedente e do crime de
lavagem não precisa ser feito, necessariamente, pelo mesmo juízo.
Exemplo: Jaime, traficante internacional de drogas, envia o lucro
decorrente do comércio ilícito de drogas, por meio de doleiros, para um paraíso
fiscal.
Quantos crimes Jaime praticou?
· Tráfico
transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I, da Lei n.° 11.343/2006);
· Evasão de divisas
(art. 22, parágrafo único, da Lei n.° 7.492/86);
· Lavagem de dinheiro
(art. 1º da Lei n.° 9.603/98).
Para que seja oferecida a denúncia por lavagem de dinheiro não é
necessário que haja condenação prévia por tráfico ou evasão de divisas
(infrações penais antecedentes), bastando que existam indícios de sua prática.
Outra pergunta: é necessário que esses três crimes sejam julgados pelo
mesmo juízo? O julgamento das três infrações precisará ser em conjunto?
NÃO. O julgamento da lavagem de dinheiro não precisa ser,
necessariamente, feito pelo mesmo juízo que irá julgar a infração penal
antecedente.
A intenção original da Lei n.° 9.603/98 era consagrar uma
autonomia absoluta entre o processo e julgamento do crime de lavagem de
dinheiro e o da infração penal antecedente.
Ocorre que a jurisprudência afirmou que essa autonomia é relativa, ou
seja, é o juiz quem irá analisar se é conveniente ou não a reunião dos
processos, de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
A Lei n.° 12.683/2012, ao alterar o
inciso II do art. 2º da Lei de Lavagem, deixou claro o que a jurisprudência e a
doutrina majoritárias já sustentavam: o julgamento do crime de lavagem de
dinheiro e da infração penal antecedente podem ser reunidos ou separados,
conforme se revelar mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz
competente para o crime de lavagem decidir sobre a unidade ou separação dos
processos.
INOVAÇÃO 3:
ANTES: a Lei de Lavagem afirmava que havia uma autonomia entre o
julgamento da lavagem e do crime antecedente, não esclarecendo se esta
autonomia era absoluta ou relativa nem o juízo responsável por decidir a
unificação ou separação dos processos.
AGORA: a alteração deixou claro que a autonomia entre o julgamento da lavagem
e da infração penal antecedente é relativa, de modo que a lavagem e a infração
antecedente podem ser julgadas em conjunto ou separadamente, conforme se
revelar mais conveniente no caso concreto, cabendo ao juiz competente para o
crime de lavagem decidir sobre a unidade ou separação dos processos.
Art. 2º, § 1º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência
do crime antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que
desconhecido ou isento de pena o autor daquele crime.
|
§ 1º A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência
da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei,
ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal
antecedente.
|
Comentários:
Como já dito, a lavagem de dinheiro é classificada como um crime derivado, acessório ou parasitário,
considerando que se trata de delito que pressupõe a ocorrência de uma infração
penal antecedente.
Em outras palavras, é necessário que o dinheiro, bens ou valores
ocultados ou dissimulados sejam provenientes de algum crime ou contravenção já
praticado.
Para que se caracterize o crime de lavagem, entretanto, não se exige
condenação prévia da infração antecedente. Segundo o art. 2º, II e § 1º da Lei,
a simples existência de indícios da prática da infração penal antecedente
autoriza a instauração de ação penal para apurar a ocorrência do delito de
lavagem de dinheiro, não sendo necessária a prévia punição dos autores do
ilícito antecedente.
Esse é o entendimento também do STJ e do STF:
“A majoritária jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no
sentido de que a apuração do crime de lavagem de dinheiro é autônoma e
independe do processamento e da condenação em crime antecedente, sendo necessário
apenas sejam apontados os indícios suficientes da prática do delito anterior.”
(HC 137.628/RJ, julgado em 26/10/2010, DJe 17/12/2010).
“(...) 5. O processo e julgamento do crime de lavagem de dinheiro é
regido pelo Princípio da Autonomia, não se exigindo, para que a denúncia que
imputa ao réu o delito de lavagem de dinheiro seja considerada apta, prova
concreta da ocorrência de uma das infrações penais exaustivamente previstas nos
incisos I a VIII do art. 1º do referido diploma legal, bastando a existência de
elementos indiciários de que o capital lavado tenha origem em algumas das
condutas ali previstas.
6. A autonomia do crime de lavagem de dinheiro viabiliza inclusive a
condenação, independente da existência de processo pelo crime antecedente.
7. É o que dispõe o artigo 2º, II, e § 1º, da Lei nº 9.613/98(...)
8. A doutrina do tema assenta: “Da própria redação do dispositivo
depreende-se que é suficiente a demonstração de indícios da existência do crime
antecedente, sendo desnecessária a indicação da sua autoria. Portanto, a
autoria ignorada ou desconhecida do crime antecedente não constitui óbice ao
ajuizamento da ação pelo crime de lavagem. (...) Na verdade, a palavra
‘indício’ usada na Lei de Lavagem representa uma prova dotada de eficácia persuasiva
atenuada (prova semiplena), não sendo apta, por si só, a estabelecer a verdade
de um fato, ou seja, no momento do recebimento da denúncia, é necessário um
início de prova que indique a probabilidade de que os bens, direitos ou valores
ocultados sejam provenientes, direta ou indiretamente, de um dos crimes
antecedentes. (...) De se ver que, no momento do recebimento da denúncia, a lei
exige indícios suficientes, e não uma certeza absoluta quanto à existência do
crime antecedente” (in Luiz Flávio Gomes - Legislação Criminal Especial,
Coordenador Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, Lavagem ou Ocultação de
Bens – Renato Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 588/590).
(...)
(HC 93368, Relator: Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em
09/08/2011)
E se houver a extinção da punibilidade pela prescrição quanto à infração
penal antecedente?
A Lei n.° 9.683/98, em sua redação
original, não dispunha expressamente a esse respeito, falando apenas que
haveria lavagem ainda que desconhecido ou isento de pena o autor da infração
antecedente.
Apesar de não haver previsão expressa na redação original da Lei n.° 9.683/98, o
STJ já tinha decidido que a extinção da punibilidade pela prescrição quanto aos
crimes antecedentes NÃO atrapalhava o reconhecimento da tipicidade do delito de
lavagem de dinheiro (Quinta Turma. HC 207.936-MG, Rel. Min. Jorge Mussi,
julgado em 27/3/2012).
A Lei n.° 12.683/2012 alterou o § 1º do
art. 2º da Lei de Lavagem para estabelecer, de modo taxativo, que poderá haver
o crime de lavagem ainda que esteja extinta a punibilidade da infração penal
antecedente.
INOVAÇÃO 4:
ANTES: a Lei n.° 9.683/98 não explicitava se
havia o crime de lavagem no caso de estar extinta a punibilidade da infração
penal antecedente.
AGORA: a alteração trouxe regra expressa no sentido de que poderá haver
o crime de lavagem ainda que esteja extinta a punibilidade da infração penal
antecedente. Vale ressaltar que já havia julgado do STJ nesse sentido, a
despeito da omissão legal. A inovação, contudo, é produtiva para que não haja
qualquer dúvida quanto a esse aspecto.
Art. 2º, § 2º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 2º No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o
disposto no art. 366 do Código de Processo Penal.
|
§ 2º No processo por crime previsto nesta Lei, não se aplica o
disposto no art. 366 do Decreto-Lei n.° 3.689, de 3
de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), devendo o acusado que não comparecer nem constituir advogado ser citado
por edital, prosseguindo o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor
dativo.
|
Comentários:
O CPP prevê o seguinte rito no procedimento comum ordinário:
· O Ministério
Público oferece a denúncia;
· O juiz analisa se é
caso de receber ou rejeitar a denúncia;
· Se o magistrado
receber a denúncia, ele determina a citação do acusado para responder à
acusação, por escrito, no prazo de 10 dias (art. 396 do CPP);
· Em regra, a citação
do acusado é feita pessoalmente, por meio de mandado de citação, que é cumprido
pelo Oficial de Justiça;
· O que acontece, no
entanto, se o réu não for encontrado para ser citado pessoalmente, mesmo tendo
se esgotado todos os meios disponíveis para localizá-lo (buscou-se, sem
sucesso, o endereço atual do acusado em todos os bancos de dados)?
· Nessa hipótese, ele
será citado por edital, com o prazo de 15 dias (art. 361 do CPP).
Como é a citação por edital?
É feito um edital de citação contendo, dentre outras informações, o nome
do juiz, a qualificação do réu, a finalidade da citação, o juízo, o dia, a hora
e o lugar em que o réu deverá comparecer (art. 365 do CPP).
Este edital é afixado na porta do edifício onde funcionar o juízo e
publicado pela imprensa, onde houver.
A citação por edital é considerada como uma espécie de citação ficta
considerando que, como não foi realizada pessoalmente, apenas se presume que o
acusado dela tomou conhecimento.
Se o acusado é citado por edital, mesmo assim o processo continua
normalmente?
O art. 366 do CPP estabelece o seguinte:
- se o acusado for
citado por edital e
- não comparecer nem
constituir advogado
- o processo e o
curso da prescrição ficarão suspensos,
- podendo o juiz
determinar apenas a produção antecipada de provas consideradas urgentes e
- se for o caso,
decretar prisão preventiva do acusado.
O objetivo do art. 366 é garantir que o acusado que não foi pessoalmente
citado não seja julgado à revelia.
Segundo previsão expressa do art. 2º, § 2º da Lei n.° 9.613/98, o
art. 366 do CPP não se aplica no caso do processo pelo crime
de lavagem de dinheiro. Por quê?
Trata-se de mera opção legislativa. O legislador entendeu que, para os
crimes de lavagem de dinheiro, deve haver um tratamento mais rigoroso ao réu,
não se aplicando a suspensão do processo:
“A suspensão do processo constituiria um prêmio para os delinquentes
astutos e afortunados e um obstáculo à descoberta de uma grande variedade de
ilícitos que se desenvolvem em parceria com a lavagem ou a ocultação.” (item 63
da Exposição de Motivos 692/MJ).
Vale ressaltar que a vedação de que seja aplicado o art. 366 do CPP aos
processos por crime de lavagem existe desde a redação original da Lei n.° 9.613/98. O
que a Lei n.° 12.683/2012 fez foi apenas melhorar a redação do art. 2º, § 2º
deixando claro que, além de não se aplicar a suspensão de que trata o art. 366
do CPP, o juiz nomeará defensor dativo para fazer a defesa técnica do réu e o
processo irá prosseguir normalmente até o seu julgamento.
A alteração foi necessária porque a doutrina criticava o fato do art.
2º, § 2º dizer que não se aplicava o art. 366 do CPP, mas não explicar qual
seria o procedimento a ser adotado então. Com a nova Lei está, portanto,
corrigida essa falha.
Continua, no entanto, uma antiga e acesa polêmica:
Essa vedação imposta pelo § 2º do art. 2º da Lei n.° 9.613/98 é
constitucional?
1ª corrente: NÃO. O dispositivo é inconstitucional por violar o
princípio da ampla defesa. Nesse sentido: Marco Antônio de Barros.
2ª corrente: SIM. Trata-se de opção legislativa legítima para este tipo
de criminalidade. É a opinião de José Paulo Baltazar Júnior e Gilmar Mendes. Há
julgados do TRF 3 seguindo esta corrente.
INOVAÇÃO 5:
ANTES: a Lei n.° 9.683/98 afirmava simplesmente
que o art. 366 do CPP não se aplicava aos processos de lavagem de dinheiro, sem
explicar qual seria o regramento a ser adotado.
AGORA: a alteração reafirmou que não se aplica o art. 366 do CPP à
lavagem de dinheiro, deixando claro que, se o acusado não comparecer nem
constituir advogado, será nomeado a ele defensor dativo, prosseguindo
normalmente o feito até o julgamento.
Art. 3º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 3º Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança
e liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá
fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade.
|
Artigo revogado.
|
Comentários
A revogação desse artigo foi extremamente acertada, considerando que ele
não estava em sintonia com as recentes alterações promovidas no CPP pela Lei n.° 12.403/2011,
além de se encontrar contrário à jurisprudência do STF.
Fiança:
A Lei n.° 12.403/2011 recrudesceu a
importância da fiança no processo penal, consagrando-a como medida alternativa
à prisão, além de ter estipulado novos valores, consentâneos com a realidade
atual.
A fiança é instrumento de grande relevância podendo ser utilizada como
garantia de futuro ressarcimento pelos prejuízos causados.
Além disso, a fiança serve para minimizar o poderio econômico das
organizações criminosas que, para conseguir a liberdade de seus líderes, terão
que desembolsar grandes quantias.
A fiança, se prestada em grande valor, serve para redistribuir o ônus do
tempo do processo fazendo com que o réu também se preocupe com a duração
razoável do processo, considerando que deseja ser ter de volta a quantia dada
em fiança.
Vale ressaltar, por fim, que o STF entende que, mesmo o crime sendo
inafiançável, é possível a concessão de liberdade provisória sem fiança (HC
104339/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.5.2012). Logo, atualmente, no Brasil é
praticamente inútil e improdutivo a lei estabelecer que determinado crime é
inafiançável.
Liberdade provisória:
O STF considera que é inconstitucional toda e qualquer lei que vede, de
forma genérica, a concessão de liberdade provisória. Nesse sentido, decidiu
recentemente o STF no caso do HC 104339/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.5.2012,
no qual se declarou inconstitucional o art. 44 da Lei n.° 11.343/2006
na parte em que proíbe a liberdade provisória para os crimes de tráfico de
drogas.
Logo, este art. 3º, apesar de não ter sido declarado pelo STF, era
igualmente inconstitucional, tendo sido em boa hora revogado.
Direito de apelar em liberdade:
A revogação também foi salutar tendo em vista que esta matéria já é
tratada, de forma consentânea com a CF/88, pelo Código de Processo Penal:
Art. 387 (...) Parágrafo único. O juiz decidirá,
fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão
preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da
apelação que vier a ser interposta.
Art. 4º, caput, da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou
representação da autoridade policial, ouvido o Ministério Público em vinte e
quatro horas, havendo indícios suficientes, poderá decretar, no curso do
inquérito ou da ação penal, a apreensão ou o seqüestro de bens, direitos ou
valores do acusado, ou existentes em seu nome, objeto dos crimes previstos
nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts. 125 a 144 do Decreto-Lei nº
3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.
|
Art. 4º O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou
mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em
24 (vinte e quatro) horas, havendo indícios suficientes de infração penal,
poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do
investigado ou acusado, ou existentes em
nome de interpostas pessoas, que
sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta Lei ou das
infrações penais antecedentes.
|
Uma das formas mais eficazes de combater o crime organizado e a lavagem
de dinheiro é buscar, ainda durante a investigação ou no início do processo, a
indisponibilidade dos bens das pessoas envolvidas, o que faz com que elas
tenham menos poder econômico para continuar delinquindo.
A experiência mostra que a prisão preventiva sem a indisponibilidade dos
bens é de pouca utilidade nesse tipo de criminalidade porque a organização
criminosa continua atuando. Os líderes, mesmo presos, comandam as atividades de
dentro das unidades prisionais ou então a organização escolhe substitutos que
continuam a praticar os mesmos crimes, considerando que ainda detêm os recursos
financeiros para a prática criminosa.
Desse modo, é indispensável que sejam tomadas medidas para garantir a
indisponibilidade dos bens e valores pertences ao criminoso ou à organização
criminosa, ainda que estejam em nome de interpostas pessoas, vulgarmente
conhecidas como “laranjas”.
O art. 4º da Lei de Lavagem trata justamente dessas medidas
assecuratórias destinadas à arrecadação cautelar e, posterior confisco dos
bens, direitos ou valores do investigado, do acusado ou das interpostas
pessoas.
A Lei n.° 12.683/2012 não trouxe mudanças
substanciais no caput do art. 4º, tendo sido apenas aprimorada
a redação original, que era menos clara que a atual.
INOVAÇÃO 6:
Tornou mais clara a redação do art. 4º da LLD, que trata sobre as
medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores:
- A redação original da Lei mencionava que o juiz poderia decretar a apreensão ou
o sequestro de bens, direitos ou valores. Por conta
dessa menção restrita à apreensão e ao sequestro, havia divergência na doutrina
se seria possível o juiz determinar também a hipoteca legal e o arresto.
A nova Lei acaba com a polêmica considerando que afirma que o juiz poderá
decretar medidas assecuratórias, terminologia mais ampla que pode
ser vista como um gênero que engloba todas essas espécies de medidas
cautelares.
- A nova Lei deixa claro que podem ser objeto das medidas assecuratórias
os bens, direitos ou valores que estejam em nome do investigado (antes da ação
penal), do acusado (após a ação penal) ou de interpostas pessoas.
- A nova Lei deixa expresso que somente podem ser objeto de medidas
assecuratórias os bens, direitos ou valores que sejam instrumento, produto ou proveito do
crime de lavagem ou das infrações penais antecedentes.
Art. 4º, § 1º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 1º As medidas assecuratórias previstas neste artigo serão levantadas
se a ação penal não for iniciada no prazo de cento e vinte dias, contados da
data em que ficar concluída a diligência.
|
§ 1º Proceder-se-á à alienação antecipada para preservação do valor
dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou
depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.
|
Comentários:
O § 1º do art. 4º previa que o sequestro e a apreensão deveriam ser
levantadas (perderiam eficácia) se a ação penal não fosse proposta pelo
Ministério Público no prazo de 120 dias. Essa previsão foi retirada pela Lei n.° 12.683/2012.
Isso significa que não existe mais prazo para intentar a ação penal, salvo se a
medida assecuratória implementada foi o sequestro porque nesse caso o Código de
Processo Penal estabelece prazo de 60 dias, dispositivo que deverá ter
aplicação no caso dos processos por crime de lavagem considerando que não há
mais regra específica na Lei n.° 9.613/98:
CPP:
Art. 131. O sequestro será levantado:
I - se a ação penal não for intentada no prazo de sessenta dias, contado
da data em que ficar concluída a diligência;
INOVAÇÃO 7:
ANTES: a Lei previa que o sequestro e a apreensão deveriam ser
levantadas se a denúncia não fosse oferecida no prazo de 120 dias.
AGORA: foi revogada essa previsão. No caso do sequestro, o CPP prevê que
ele será levantado se a ação penal não for intentada no prazo de 60 dias. Essa
regra agora deve ser aplicada também aos processos de lavagem de dinheiro.
Comentários:
O § 1º, com a nova redação dada pela Lei n.° 12.683/2012,
trata agora sobre a possibilidade dealienação antecipada dos bens
que são arrecadados por medidas assecuratórias.
Como visto acima, é muito importante para o sucesso do combate à lavagem
de dinheiro que sejam tomadas medidas para tornar indisponíveis os bens,
direitos e valores pertencentes às pessoas envolvidas nos crimes ainda durante
a investigação ou logo no início da ação penal.
Ocorre que após tornar indisponíveis os bens dos investigados, acusados
ou interpostas pessoas, surge um problema prático para o Poder Público: o
que fazer com tais bens enquanto não ocorre o trânsito em julgado de uma
sentença condenatória, quando então haveria o perdimento desses bens em favor
da União?
No Brasil, o trânsito em julgado de uma sentença condenatória por
lavagem de dinheiro demora às vezes 10, 12 anos ou até mais. Nesse período, os
bens que foram objeto de medidas assecuratórias ficam perecendo e, ao final do
processo, não valem nada ou têm seu valor reduzido absurdamente. Tome-se como
exemplo um automóvel que seja apreendido. Este veículo, ao final do processo,
ou seja, ao longo de 12 anos em que ficou sem manutenção, valerá muito pouco.
A solução que tem sido defendida pelos estudiosos para esses casos,
sendo, inclusive, recomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (Recomendação
n.° 30/2010), é a alienação antecipada dos bens.
O que é a alienação antecipada de bens?
A alienação antecipada é
- a venda,
- por meio de leilão,
- antes do trânsito
em julgado da ação penal,
- dos bens que foram
objeto de medidas assecuratórias e
- que estão sujeitos
a qualquer grau de deterioração ou depreciação,
- ou quando houver
dificuldade para sua manutenção.
O que acontece com o recurso arrecadado com a alienação antecipada?
A quantia apurada com a alienação antecipada fica depositada em conta
judicial, até o final da ação penal respectiva.
Se o réu for absolvido, os recursos serão devolvidos a ele.
Em caso de condenação, o réu será privado definitivamente dessa quantia,
cujo destino irá variar de acordo com o crime cometido e com a natureza da
apreensão do bem. Ex1: se o bem alienado era instrumento, produto ou proveito
do crime de lavagem, o valor obtido será perdido em favor da União ou do Estado
(art. 7º, I, da Lei n.° 9.613/98). Ex2: na hipótese de
tráfico de drogas, a quantia arrecadada será destinada ao Fundo Nacional
Antidrogas (art. 62, § 9º, da Lei n.° 11.343/2006).
A alienação antecipada é inconstitucional por violar o princípio do
devido processo legal, o princípio da presunção de inocência e o direito de
propriedade?
NÃO.
O devido processo legal não é afrontado, considerando que a constrição
sobre os bens da pessoa não é feita de forma arbitrária, sendo, ao contrário,
prevista na lei que traz os balizamentos para que ela possa ocorrer.
Não há violação ao princípio da presunção de inocência, considerando que
este não é absoluto e não impede a decretação de medidas cautelares contra o
réu desde que se revelem necessárias e proporcionais no caso concreto. Nesse
mesmo sentido, não é inconstitucional a prisão preventiva, o arresto, o
sequestro, a busca e apreensão etc.
O direito de propriedade, que também não é absoluto, não é vilipendiado
porque o réu somente irá perder efetivamente o valor econômico do bem se houver
o trânsito em julgado da condenação.
Qual é o regramento da alienação antecipada?
Código de Processo Penal
(processos penais em geral)
|
Lei n.° 11.343/2006
(processos da Lei de Drogas)
|
Lei n.° 12.683/2012
(processos da Lei de Lavagem)
|
O tratamento dado pelo CPP ao tema foi muito acanhado tendo em vista
que, na época em que foi editado, os processos penais não eram tão demorados
e o tipo de criminalidade existente não exigia tais respostas.
Por essas razões, há apenas um dispositivo que autoriza a alienação
antecipada em caso de coisas facilmente deterioráveis (art.
120, § 5º).
|
Atento à nova realidade, permite a alienação antecipada de veículos,
embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte, os
maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza,
utilizados para a prática dos crimes definidos nesta Lei (art. 62, § 4º).
|
Prossegue nessa tendência de ampliar a possibilidade de alienação
antecipada afirmando que isso irá ocorrer sempre que os bens que foram objeto
de medidas assecuratórias, nos processos de lavagem de dinheiro, estiverem
sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou
quando houver dificuldade para sua manutenção (art. 4º, § 1º da Lei n.° 9.613/98).
|
Qual é o procedimento da alienação antecipada na Lei de Lavagem?
A Lei n.° 12.683/2012 acrescentou o art.
4ºA prevendo o procedimento da alienação antecipada nos processos envolvendo
lavagem de dinheiro.
Este novo art. 4º A é de fundamental relevância na prática, não sendo,
contudo, de grande importância para fins de concurso público.
Segue o dispõe o novel art. 4º A:
Art. 4ºA. A alienação antecipada para preservação de valor de bens sob
constrição será decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério
Público ou por solicitação da parte interessada, mediante petição autônoma, que
será autuada em apartado e cujos autos terão tramitação em separado em relação
ao processo principal.
§ 1º O requerimento de alienação deverá conter a relação de todos os
demais bens, com a descrição e a especificação de cada um deles, e informações
sobre quem os detém e local onde se encontram.
§ 2º O juiz determinará a avaliação dos bens, nos autos apartados, e
intimará o Ministério Público.
§ 3º Feita a avaliação e dirimidas eventuais divergências sobre o
respectivo laudo, o juiz, por sentença, homologará o valor atribuído aos bens e
determinará sejam alienados em leilão ou pregão, preferencialmente eletrônico,
por valor não inferior a 75% (setenta e cinco por cento) da avaliação.
§ 4º Realizado o leilão, a quantia apurada será depositada em conta
judicial remunerada, adotando-se a seguinte disciplina:
I - nos processos de competência da Justiça Federal e da Justiça do
Distrito Federal:
a) os depósitos serão efetuados na Caixa Econômica Federal ou em
instituição financeira pública, mediante documento adequado para essa
finalidade;
b) os depósitos serão repassados pela Caixa Econômica Federal ou por
outra instituição financeira pública para a Conta Única do Tesouro Nacional,
independentemente de qualquer formalidade, no prazo de 24 (vinte e quatro)
horas; e
c) os valores devolvidos pela Caixa Econômica Federal ou por instituição
financeira pública serão debitados à Conta Única do Tesouro Nacional, em
subconta de restituição;
II - nos processos de competência da Justiça dos Estados:
a) os depósitos serão efetuados em instituição financeira designada em
lei, preferencialmente pública, de cada Estado ou, na sua ausência, em
instituição financeira pública da União;
b) os depósitos serão repassados para a conta única de cada Estado, na
forma da respectiva legislação.
§ 5º Mediante ordem da autoridade judicial, o valor do depósito, após o
trânsito em julgado da sentença proferida na ação penal, será:
I - em caso de sentença condenatória, nos processos de competência da
Justiça Federal e da Justiça do Distrito Federal, incorporado definitivamente
ao patrimônio da União, e, nos processos de competência da Justiça Estadual,
incorporado ao patrimônio do Estado respectivo;
II - em caso de sentença absolutória extintiva de punibilidade, colocado
à disposição do réu pela instituição financeira, acrescido da remuneração da
conta judicial.
§ 6º A instituição financeira depositária manterá controle dos valores
depositados ou devolvidos.
§ 7º Serão deduzidos da quantia apurada no leilão todos os tributos e
multas incidentes sobre o bem alienado, sem prejuízo de iniciativas que, no
âmbito da competência de cada ente da Federação, venham a desonerar bens sob
constrição judicial daqueles ônus.
§ 8º Feito o depósito a que se refere o § 4o deste artigo, os autos da
alienação serão apensados aos do processo principal.
§ 9º Terão apenas efeito devolutivo os recursos interpostos contra as
decisões proferidas no curso do procedimento previsto neste artigo.
§ 10. Sobrevindo o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória, o juiz decretará, em favor, conforme o caso, da União ou do
Estado:
I - a perda dos valores depositados na conta remunerada e da fiança;
II - a perda dos bens não alienados antecipadamente e daqueles aos quais
não foi dada destinação prévia; e
III - a perda dos bens não reclamados no prazo de 90 (noventa) dias após
o trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvado o direito de lesado
ou terceiro de boa-fé.
§ 11. Os bens a que se referem os incisos II e III do § 10 deste
artigo serão adjudicados ou levados a leilão, depositando-se o saldo na conta
única do respectivo ente.
§ 12. O juiz determinará ao registro público competente que emita
documento de habilitação à circulação e utilização dos bens colocados sob o uso
e custódia das entidades a que se refere o caput deste artigo.
§ 13. Os recursos decorrentes da alienação antecipada de bens,
direitos e valores oriundos do crime de tráfico ilícito de drogas e que tenham
sido objeto de dissimulação e ocultação nos termos desta Lei permanecem
submetidos à disciplina definida em lei específica.
Essa nova disciplina estabelecida pela Lei n.° 12.683/2012,
relativa à Lavagem de Dinheiro, poderá ser aplicada aos demais delitos?
SIM. Entendo que esse § 1º do art. 4º, assim como o art. 4º A, da Lei n.° 9.613/98
poderão ser aplicados, por analogia, a todos os demais crimes.
A alienação antecipada, ao contrário do que pode parecer a princípio, é
medida menos gravosa ao réu porque transformado o valor de seu bem em dinheiro,
que será depositado em conta sujeita à correção monetária, ele não irá sofrer
os prejuízos decorrentes da desvalorização natural da coisa.
Tome-se novamente o exemplo de um automóvel. Se em 2012 é apreendido o
veículo de um réu, é bem melhor que esse veículo seja vendido logo, preservando
seu valor de mercado, do que se fique aguardando 10 anos até que haja o
trânsito em julgado.
Ainda que o réu seja absolvido, ele preferirá receber o valor do carro
vendido, com a devida correção monetária, do que a ele ser devolvido um veículo
velho e desvalorizado.
INOVAÇÃO 8:
ANTES: não havia previsão expressa de alienação antecipada para os
processos de lavagem de dinheiro.
AGORA: a Lei de Lavagem de Dinheiro passou prever, de forma expressa e
ampla, a possibilidade de alienação antecipada sempre que os bens objeto de
medidas assecuratórias estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou
depreciação, ou quando houver dificuldade para a sua manutenção.
Art. 4º, § 2º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 2º O juiz determinará a liberação dos bens, direitos e valores
apreendidos ou sequestrados quando comprovada a licitude de sua origem.
|
§ 2º O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens,
direitos e valores quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores
necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações
pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.
|
Comentários
O novo § 2º tem agora duas partes:
1ª parte:
|
O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e
valores quando comprovada a licitude de sua origem, (...)
Essa primeira parte, em sua essência, já existia no texto original.
Após o juiz ter decretado a constrição de bens, direitos e valores, a
pessoa prejudicada poderá formular ao juiz um pedido de restituição, mas
somente conseguirá a liberação antecipada (antes da sentença) se conseguir
provar que têm origem lícita.
Por isso, alguns autores afirmam que se trata de uma inversão da
prova, considerando que é a parte lesada (e não o MP) que terá que provar que
o bem, direito ou valor possui origem lícita para que seja liberado antes do
trânsito em julgado.
Vale ressaltar que mesmo se o bem tiver ficado apreendido durante todo
o processo sem que o interessado consiga provar sua origem lícita, ao final,
se ele for absolvido, a liberação ocorre por força dessa sentença
absolutória. Em outras palavras, essa inversão do ônus da prova ocorre
somente para a liberação antes do trânsito em julgado.
|
2ª parte:
|
(...) mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores
necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações
pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal.
A novidade está nesta segunda parte.
Mesmo que a parte lesada consiga provar a origem lícita, ainda assim a
constrição continuará a incidir sobre os bens, direitos e valores necessários
e suficientes para arcar com a reparação dos danos causados pelo crime e para
o pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes do
processo.
|
INOVAÇÃO 9:
ANTES: se a parte prejudicada conseguisse provar que os bens, direitos
ou valores apreendidos ou sequestrados possuíam origem lícita eles deveriam ser
restituídos.
AGORA: mesmo se a parte conseguir provar que os bens, direitos ou
valores constritos possuem origem lícita, ainda assim eles podem permanecer
indisponíveis no montante necessário para reparação dos danos e para o
pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração
penal. Em outras palavras, o simples fato de ter origem lícita não autoriza a
liberação de bens apreendidos.
Art. 4º, § 3º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 3º Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento
pessoal do acusado, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à
conservação de bens, direitos ou valores, nos casos do art. 366 do Código de
Processo Penal.
|
§ 3º Nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento
pessoal do acusado ou de interposta pessoa a
que se refere o caput deste artigo, podendo o juiz determinar a prática de
atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo do disposto no § 1º (obs:
o § 1º trata da alienação antecipada).
|
Comentários:
Quando o investigado/acusado ou a pessoa interposta tem seus bens
apreendidos por ordem judicial, ela tem a possibilidade de obtê-los de volta
mesmo antes do resultado final do processo formulando umpedido de
restituição dirigido ao juiz.
Conforme vimos no § 2º acima, neste pedido de restituição, o interessado
deverá provar que o bem, direito ou valor que foi tornado indisponível possui
origem lícita. Além disso, o interessado que formula o pleito de restituição
deverá comparecer pessoalmente em juízo, sob pena do pedido
não ser nem conhecido (não ter seu mérito analisado).
Desse modo, se determinado réu encontra-se foragido e, por intermédio de
advogado, formula pedido de restituição de seus bens apreendidos, o juiz nem
irá examinar esse pleito, a não ser que o acusado compareça pessoalmente em
juízo.
Enquanto o réu não comparecer pessoalmente para solicitar a restituição
de seus bens, direitos e valores, o juízo deverá determinar a prática de atos
para conservá-los.
A Lei n.° 12.683/2012 mantém essa mesma
regra, melhorando, contudo, a redação do dispositivo ao retirar a menção que
era feita ao art. 366 do CPP. Essa remissão causava inúmeras confusões
considerando que a Lei de Lavagem dizia, já em sua redação original, que não se
aplicava o art. 366 do CPP. Tal polêmica, contudo, é passado tendo em vista que
o novo § 3º não faz qualquer referência ao dispositivo, deixando ainda mais
claro que ele não se aplica aos processos por crime de lavagem.
Outro ponto digno de nota é que o novo § 3º reafirma a possibilidade do
juiz determinar a alienação antecipada dos bens apreendidos e que não forem
restituídos.
Assim, por exemplo, se o réu foragido formula pedido de restituição de
um carro e não comparece pessoalmente ao processo, o juiz não irá conhecer do
pedido e, como forma de preservar o valor econômico do automóvel, determinará a
sua alienação antecipada em leilão, depositando a quantia apurada em conta
judicial.
Art. 4º, § 4º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
§ 4º A ordem de prisão de pessoas ou da apreensão ou sequestro de
bens, direitos ou valores, poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido o Ministério
Público, quando a sua execução imediata possa comprometer as investigações.
|
§ 4º Poderão ser decretadas medidas assecuratórias sobre bens,
direitos ou valores para reparação do dano decorrente da infração penal
antecedente ou da prevista nesta Lei ou para pagamento de prestação
pecuniária, multa e custas.
|
Comentários ao antigo § 4º:
A redação original do § 4º previa expressamente a possibilidade de ser
adotada a ação controlada nas investigações envolvendo Lavagem de Dinheiro.
A ação controlada “consiste no retardamento da intervenção policial,
que deve ocorrer no momento mais oportuno do ponto de vista da investigação
criminal ou da colheita de provas” (LIMA, Renato Brasileiro de.Manual de
Processo Penal. Vol. 1, Niterói: Impetus, 2012, p. 1278).
A ação controlada continua a ser prevista na Lei de Lavagem?
SIM, no entanto, a ação controlada é agora disciplinada no art. 4º B,
inserido pela Lei n.° 12.683/2012. Desse modo, não
houve revogação da ação controlada na Lei de Lavagem. Ao contrário, a redação
do novo art. 4º B é praticamente idêntica ao que já era previsto no § 4º do
art. 4º:
Art. 4º-B. A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de
bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério
Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações.
Comentários ao novo § 4º:
O novo § 4º supre uma lacuna que existia na Lei anterior e prevê
expressamente a possibilidade de serem decretadas medidas assecuratórias
(apreensão, sequestro, arresto e hipoteca legal) sobre bens, direitos ou
valores para reparação do dano decorrente da infração penal antecedente ou do
crime de lavagem ou ainda para pagamento de prestação pecuniária, multa e
custas do processo.
INOVAÇÃO 10:
ANTES: não havia previsão expressa de constrição de bens para custear a
reparação dos danos decorrente da infração ou para pagamento de prestação
pecuniária, multas e custas, o que gerava divergências na doutrina e
jurisprudência.
AGORA: há previsão expressa de que sejam decretadas medidas
assecuratórias sobre bens, direitos ou valores para reparação do dano
decorrente da infração penal antecedente ou do crime de lavagem ou ainda para
pagamento de prestação pecuniária, multa e custas do processo.
Art. 7º, inciso I, da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 7º São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal:
I - a perda, em favor da União, dos bens, direitos e valores objeto de
crime previsto nesta Lei, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de
boa-fé;
|
Art. 7º São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal:
I - a perda, em favor da União - e
dos Estados, nos casos de competência da Justiça Estadual -, de
todos os bens, direitos e valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática dos crimes previstos
nesta Lei, inclusive aqueles utilizados
para prestar a fiança, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro
de boa-fé;
|
Comentários:
A redação original desse art. 7º, I era completamente
desnecessária considerando que esse efeito já era previsto, de forma genérica,
ou seja, para todos os crimes, no art. 91, II, do CP:
Art. 91. São efeitos da condenação:
(...)
II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de
terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo
fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;
b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua
proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.
Contudo, a nova redação do art. 7º, I traz duas novidades interessantes:
INOVAÇÃO 11:
ANTES: o art. 7º, I, previa, como efeito da condenação, o perdimento de
bens, direitos e valores que tinham sido objeto de lavagem de dinheiro.
AGORA: a nova redação do art. 7º, I é mais ampla e prevê, como efeito da
condenação, o perdimento de bens, direitos e valores relacionados, direta
ou indiretamente, à prática de lavagem de dinheiro, inclusive aqueles
utilizados para prestar a fiança. A nova Lei aumenta, assim, as possibilidades
de perdimento.
INOVAÇÃO 12:
ANTES: o art. 7º, I, previa que o perdimento dos bens, direitos e
valores objetos de lavagem de dinheiro ocorria sempre em favor da União.
AGORA: a nova redação do art. 7º, I prevê que o perdimento dos bens,
direitos e valores relacionados com a lavagem de dinheiro
pode ocorrer em favor da União ou do Estado.
O perdimento será em favor da União se o crime de
lavagem, no caso concreto, for de competência federal.
Por outro lado, o perdimento será revertido para o
respectivo Estado se o processo criminal por lavagem,na situação
específica, for de competência da Justiça Estadual.
Art. 7º, §§ 1º e 2º, da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Não havia § 1º no art. 7º.
|
§ 1º A União e os Estados, no âmbito de suas competências,
regulamentarão a forma de destinação dos bens, direitos e valores cuja perda
houver sido declarada, assegurada, quanto aos processos de competência da
Justiça Federal, a sua utilização pelos órgãos federais encarregados da
prevenção, do combate, da ação penal e do julgamento dos crimes previstos
nesta Lei, e, quanto aos processos de competência da Justiça Estadual, a
preferência dos órgãos locais com idêntica função.
|
Não havia § 2º no art. 7º.
|
§ 2º Os instrumentos do crime sem valor econômico cuja perda em favor
da União ou do Estado for decretada serão inutilizados ou doados a museu
criminal ou a entidade pública, se houver interesse na sua conservação.
|
Comentários:
Como vimos acima, o perdimento dos bens, direitos e valores ocorre em
favor da União (nos casos de processos de competência federal) e em favor dos
Estados (nas hipóteses de competência estadual).
A Lei acrescenta esse § 1º ao art. 7º afirmando que a União e os Estados
poderão editar atos infralegais disciplinando para onde serão destinados os
bens, direitos e valores cujo perdimento houver sido declarado.
A própria Lei, contudo, limita a discricionariedade do regulamento
afirmando que deverá ser assegurada a utilização de tais bens, direitos e
valores pelos órgãos encarregados da prevenção (ex: COAF), do combate (ex:
Polícia Federal), da ação penal (ex: Ministério Público) e do julgamento (ex:
varas especializadas) de lavagem de dinheiro.
O § 2º também foi acrescentado ao art. 7º não havendo, contudo, qualquer
comentário digno de registro, sendo o dispositivo muito claro.
Art. 9º da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 9º Sujeitam-se às obrigações referidas nos arts. 10 e 11 as
pessoas jurídicas que tenham, em caráter permanente ou eventual, como
atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não:
I - a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de
terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;
II - a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo
financeiro ou instrumento cambial;
III - a custódia, emissão, distribuição, liqüidação, negociação,
intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários.
|
Art. 9º Sujeitam-se às obrigações referidas nos arts. 10 e 11 as pessoas físicas e jurídicas que tenham, em caráter permanente ou
eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não:
I - a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de
terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;
II - a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo
financeiro ou instrumento cambial;
III - a custódia, emissão, distribuição, liqüidação, negociação,
intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários.
|
Comentários
Para que haja um eficiente combate à lavagem de dinheiro é necessário
que o Poder Público tenha certo registro e controle sobre as seguintes
atividades, considerando que elas podem ser utilizadas indevidamente como
mecanismo destinado à lavagem de capitais:
· Captação,
intermediação e aplicação de recursos financeiros;
· Compra e venda de
moeda estrangeira;
· Compra e venda de
ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial;
· Quaisquer espécies
de negócios envolvendo títulos ou valores mobiliários.
Logo, a Lei determinava, neste art. 9º, que as pessoas jurídicas que
desenvolvessem essas atividades, estariam sujeitas a obrigações previstas nos
arts. 10 e 11. Os arts. 10 e 11, que veremos mais a frente, trazem uma série de
obrigações relacionas com a identificação e o registro dos indivíduos que se
utilizam desses serviços. É o caso, por exemplo, de uma casa de câmbio que é
obrigada a exigir o nome, o CPF e a assinatura de toda e qualquer pessoa que
compre dólar em sua loja.
O que a Lei n.° 12.683/2012
alterou sobre esse assunto?
A nova Lei trouxe previsão expressa de que estão sujeitas às obrigações
dos arts. 10 e 11 não apenas as pessoas jurídicas, mas também as
pessoas físicas que desenvolvam atividades relacionadas com a
movimentação de recursos financeiros, com a compra e venda de moeda estrangeira
e de ouro, bem como com negócios envolvendo títulos ou valores imobiliários.
INOVAÇÃO 12:
ANTES: a Lei previa esta obrigação para as pessoas físicas apenas em
algumas situações específicas, como as trazidas pelos incisos IX a XII do
parágrafo único do art. 9º.
AGORA: a Lei prevê, de forma genérica, que todas as pessoas físicas que
trabalham com as atividades listadas no art. 9º estão sujeitas às obrigações
previstas nos arts. 10 e 11.
Art. 9º, parágrafo único, da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 9º (...)
Parágrafo único. Sujeitam-se às mesmas
obrigações:
I - as bolsas de valores e bolsas de mercadorias ou futuros;
(...)
X - as pessoas jurídicas que exerçam atividades de promoção
imobiliária ou compra e venda de imóveis;
(...)
XII - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de luxo
ou de alto valor ou exerçam atividades que envolvam grande volume de recursos
em espécie.
(...)
Não havia esse inciso XIII.
Não havia esse inciso XIV.
Não havia esse inciso XV.
Não havia esse inciso XVI.
Não havia esse inciso XVII.
Não havia esse inciso XVIII.
|
Art. 9º (...)
Parágrafo único. Sujeitam-se às mesmas obrigações:
I – as bolsas de valores, as bolsas de mercadorias ou futuros e os sistemas de negociação do mercado de
balcão organizado;
(...)
X - as pessoas físicas ou
jurídicas que exerçam atividades de promoção imobiliária ou compra e venda de
imóveis;
(...)
XII - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem bens de luxo
ou de alto valor,intermedeiem a sua
comercialização ou exerçam atividades que envolvam grande volume
de recursos em espécie;
(...)
XIII - as juntas comerciais e os registros
públicos;
XIV - as pessoas físicas ou jurídicas que
prestem, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria,
contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza,
em operações:
a) de compra e venda de imóveis, estabelecimentos
comerciais ou industriais ou participações societárias de qualquer natureza;
b) de gestão de fundos, valores mobiliários ou
outros ativos;
c) de abertura ou gestão de contas bancárias, de
poupança, investimento ou de valores mobiliários;
d) de criação, exploração ou gestão de sociedades
de qualquer natureza, fundações, fundos fiduciários ou estruturas análogas;
e) financeiras, societárias ou imobiliárias; e
f) de alienação ou aquisição de direitos sobre
contratos relacionados a atividades desportivas ou artísticas profissionais;
XV - pessoas físicas ou jurídicas que atuem na
promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de
direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou
eventos similares;
XVI - as empresas de transporte e guarda de
valores;
XVII - as pessoas físicas ou jurídicas que
comercializem bens de alto valor de origem rural ou animal ou intermedeiem a
sua comercialização; e
XVIII - as dependências no exterior das entidades
mencionadas neste artigo, por meio de sua matriz no Brasil, relativamente a
residentes no País.
|
Comentários
Além das pessoas físicas e jurídicas elencadas no caput do art. 9º, o
parágrafo único do mesmo artigo prevê um rol de pessoas físicas e jurídicas que
também possuem as obrigações previstas nos arts. 10 e 11 da Lei de Lavagem.
O que fez a Lei n.° 12.683/2012
com relação ao elenco de pessoas obrigadas previsto no parágrafo único do art.
9º?
A nova Lei atualizou a redação de três incisos (I, X e XII) com o
objetivo de abranger mais pessoas que desenvolvam tais atividades.
Além disso, a nova Lei acrescentou 6 novos incisos incluindo novas
hipóteses em que pessoas físicas/jurídicas também obrigadas a prestar as
informações de que tratam os arts. 10 e 11.
Para fins de concurso é extremamente importante conhecer e memorizar os
incisos que foram acrescentados.
A inclusão de algumas atividades gerará intensa polêmica e, certamente,
será objeto de ações de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal.
É o caso, por exemplo, do novel inciso XIV. Pela redação do dispositivo,
pode ser incluído como obrigado um advogado ou escritório de advocacia que
tenha prestado assessoria a determinado empresário para a constituição de uma offshore no
exterior.
Desse modo, o Governo exigirá que o advogado preste as informações de
que tratam os arts. 10 e 11 e o advogado certamente alegará sigilo profissional
para não fornecer os dados. Surgirá o conflito: direito ao sigilo profissional
X direito do Estado de prevenir a prática de ilícitos.
Sem me alongar muito, até porque o tema é profundo e exige considerações
substanciosas sobre a relatividade dos direitos, entendo que não há qualquer
inconstitucionalidade na previsão, considerando que as obrigações de que tratam
os arts. 10 e 11, conforme se verá adiante, são proporcionais e não aniquilam o
sigilo profissional, mas simplesmente estabelecem limitações legítimas a esse
direito, que não é absoluto e que não pode servir como escudo para a prática de
atividades ilícitas.
INOVAÇÃO 13:
AGORA: os incisos I, X e XII do parágrafo único do art. 9º tiveram sua
redação modificada e foram incluídas seis novas atividades (incisos XIII a
XVIII) cujas pessoas que as exercem passam a ter as obrigações previstas nos
arts. 10 e 11 da Lei de Lavagem.
Art. 10 da Lei n.° 9.613/98
Da Identificação dos Clientes e Manutenção de Registros
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 10. As pessoas referidas no art. 9º:
I - identificarão seus clientes e manterão cadastro atualizado, nos
termos de instruções emanadas das autoridades competentes;
II - manterão registro de toda transação em moeda nacional ou
estrangeira, títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ou
qualquer ativo passível de ser convertido em dinheiro, que ultrapassar limite
fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções por esta
expedidas;
III - deverão atender, no prazo fixado pelo órgão judicial competente,
as requisições formuladas pelo Conselho criado pelo art. 14, que se
processarão em segredo de justiça.
|
Sem alteração.
Sem alteração.
Sem alteração.
III - deverão adotar políticas, procedimentos e
controles internos, compatíveis com seu porte e volume de operações, que lhes
permitam atender ao disposto neste artigo e no art. 11, na forma disciplinada
pelos órgãos competentes;
IV - deverão cadastrar-se e manter seu cadastro
atualizado no órgão regulador ou fiscalizador e, na falta deste, no Conselho
de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), na forma e condições por eles
estabelecidas;
V - deverão atender às requisições formuladas
pelo Coaf na periodicidade, forma e condições por ele estabelecidas,
cabendo-lhe preservar, nos termos da lei, o sigilo das informações prestadas.
|
Comentários
Conforme explicado, as pessoas de que trata o art. 9º, caput e
parágrafo, devem cumprir as obrigações previstas nos arts. 10 e 11 da Lei.
O inciso III foi modificado e os incisos IV e V foram inseridos pela Lei
n.° 12.683/2012.
INOVAÇÃO 14:
A Lei ampliou as obrigações previstas no art. 10 da Lei de Lavagem e que
devem ser cumpridas pelas pessoas de que trata o art. 9º.
Art. 11 da Lei n.° 9.613/98
Da Comunicação de Operações Financeiras
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 11. As pessoas referidas no art. 9º:
I - dispensarão especial atenção às operações que, nos termos de
instruções emanadas das autoridades competentes, possam constituir-se em
sérios indícios dos crimes previstos nesta Lei, ou com eles relacionar-se;
II - deverão comunicar, abstendo-se de dar aos clientes ciência de tal
ato, no prazo de vinte e quatro horas, às autoridades competentes:
a) todas as transações constantes do inciso II do art. 10 que
ultrapassarem limite fixado, para esse fim, pela mesma autoridade e na forma
e condições por ela estabelecidas, devendo ser juntada a identificação a que
se refere o inciso I do mesmo artigo;
b) a proposta ou a realização de transação prevista no inciso I deste
artigo.
Não havia esse inciso III.
§ 3º As pessoas para as quais não exista órgão próprio fiscalizador ou
regulador farão as comunicações mencionadas neste artigo ao Conselho de
Controle das Atividades Financeiras - COAF e na forma por ele estabelecida.
|
Sem alteração.
Sem alteração.
II - deverão comunicar ao Coaf,
abstendo-se de dar ciência de tal ato a
qualquer pessoa, inclusive àquela à qual se refira a informação, no
prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a proposta ou realização:
a) de todas as transações referidas no inciso II do art. 10,
acompanhadas da identificação de que trata o inciso I do mencionado artigo; e
b) das operações referidas no inciso I;
III - deverão comunicar ao órgão regulador ou fiscalizador da sua
atividade ou, na sua falta, ao Coaf, na periodicidade, forma e condições por
eles estabelecidas, a não ocorrência de propostas, transações ou operações
passíveis de serem comunicadas nos termos do inciso II.
§ 3º O Coaf disponibilizará as comunicações recebidas com base no
inciso II do caput aos respectivos órgãos responsáveis pela regulação ou
fiscalização das pessoas a que se refere o art. 9º.
|
Comentários
As alterações promovidas neste artigo não foram profundas e mostram-se
sem muita relevância para fins de concurso. Pode ser cobrada, no entanto, a
nova redação dos dispositivos.
Art. 11-A da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Não havia esse art. 11-A.
|
Art. 11-A. As transferências internacionais e os saques em espécie
deverão ser previamente comunicados à instituição financeira, nos termos,
limites, prazos e condições fixados pelo Banco Central do Brasil.
|
Comentários
Alteração sem tanta relevância para fins de concurso. Pode ser cobrada,
no entanto, a nova redação do dispositivo.
Art. 12 da Lei n.° 9.613/98
Responsabilidade administrativa
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 12. Às pessoas referidas no art. 9º, bem como aos administradores
das pessoas jurídicas, que deixem de cumprir as obrigações previstas nos
arts. 10 e 11 serão aplicadas, cumulativamente ou não, pelas autoridades
competentes, as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa pecuniária variável, de um por cento até o dobro do valor
da operação, ou até duzentos por cento do lucro obtido ou que presumivelmente
seria obtido pela realização da operação, ou, ainda, multa de até R$
200.000,00 (duzentos mil reais);
III - inabilitação temporária, pelo prazo de até dez anos, para o
exercício do cargo de administrador das pessoas jurídicas referidas no art.
9º;
IV - cassação da autorização para operação ou funcionamento.
§ 1º A pena de advertência será aplicada por irregularidade no
cumprimento das instruções referidas nos incisos I e II do art. 10.
§ 2º A multa será aplicada sempre que as pessoas referidas no art. 9º,
por negligência ou dolo:
I – deixarem de sanar as irregularidades objeto de advertência, no
prazo assinalado pela autoridade competente;
II – não realizarem a identificação ou o registro previstos nos
incisos I e II do art. 10;
III - deixarem de atender, no prazo, a requisição formulada nos termos
do inciso III do art. 10;
IV - descumprirem a vedação ou deixarem de fazer a comunicação a que
se refere o art. 11.
|
Sem alteração.
Sem alteração.
II - multa pecuniária variável não superior:
a) ao dobro do valor da operação;
b) ao dobro do lucro real obtido ou que
presumivelmente seria obtido pela realização da operação; ou
c) ao valor de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de
reais);
Sem alteração.
IV - cassação ou suspensão da
autorização para o exercício de atividade, operação ou funcionamento.
Sem alteração.
§ 2º A multa será aplicada sempre que as pessoas referidas no art. 9º,
por culpa ou dolo:
Sem alteração.
II - não cumprirem o disposto nos incisos I a IV
do art. 10;
III - deixarem de atender, no
prazo estabelecido, a requisição formulada nos termos do inciso V do art. 10;
Sem alteração.
|
Comentários
As alterações promovidas neste artigo não foram profundas e mostram-se
sem tanta relevância para fins de concurso. Pode ser cobrada, no entanto, a
nova redação dos dispositivos.
Art. 16 da Lei n.° 9.613/98
|
|
ANTES da Lei n.° 12.683/2012
|
DEPOIS da Lei n.° 12.683/2012
|
Art. 16. O COAF será composto por servidores públicos de reputação
ilibada e reconhecida competência, designados em ato do Ministro de Estado da
Fazenda, dentre os integrantes do quadro de pessoal efetivo do Banco Central do
Brasil, da Comissão de Valores Mobiliários, da Superintendência de Seguros
Privados, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Secretaria da Receita
Federal, de órgão de inteligência do Poder Executivo, do Departamento de
Polícia Federal, do Ministério das Relações Exteriores e da
Controladoria-Geral da União, atendendo, nesses quatro últimos casos, à
indicação dos respectivos Ministros de Estado.
|
Art. 16. O Coaf será composto por servidores públicos de reputação
ilibada e reconhecida competência, designados em ato do Ministro de Estado da
Fazenda, dentre os integrantes do quadro de pessoal efetivo do Banco Central
do Brasil, da Comissão de Valores Mobiliários, da Superintendência de Seguros
Privados, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Secretaria da Receita
Federal do Brasil, da Agência Brasileira
de Inteligência, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Justiça, do Departamento de
Polícia Federal, do Ministério da
Previdência Social e da Controladoria-Geral da União, atendendo à indicação dos respectivos Ministros de
Estado.
|
Comentários
As alterações promovidas neste artigo não foram profundas e mostram-se
sem tanta relevância para fins de concurso. Pode ser cobrada, no entanto, a
nova redação dos dispositivos.
CAPÍTULO X
DISPOSIÇÕES GERAIS
Foi acrescentado um novo capítulo à Lei n.° 9.613/98 (Capítulo X –
Disposições Gerais) com cinco novos artigos. Vejamos cada um deles:
Art. 17-A. Aplicam-se, subsidiariamente, as disposições do Decreto-Lei
n.° 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), no que
não forem incompatíveis com esta Lei.
Comentários:
Desse modo, em caso de lacunas e omissões, o CPP é aplicado nos
processos que envolvam os crimes de lavagem de dinheiro.
Art. 17-B. A autoridade policial e o Ministério Público terão acesso,
exclusivamente, aos dados cadastrais do investigado que informam qualificação
pessoal, filiação e endereço, independentemente de autorização judicial,
mantidos pela Justiça Eleitoral, pelas empresas telefônicas, pelas instituições
financeiras, pelos provedores de internet e pelas administradoras de cartão de
crédito.
Comentários:
Apesar da redação do artigo não ser das melhores, o que quis dizer o
dispositivo foi o seguinte:
- O delegado de
polícia e o membro do Ministério Público
- poderão requisitar
diretamente (ou seja, sem necessidade de autorização judicial),
- das empresas de
telefonia, das instituições financeiras, dos provedores de internet e das
administradoras de cartão de crédito e da Justiça Eleitoral,
- os dados cadastrais
do investigado
- que contenham a sua
qualificação pessoal, filiação e endereço.
Como funcionava antes?
O delegado de polícia ou o membro do Ministério Público formulava
requerimento à autoridade judicial que analisava o pedido e, motivadamente,
deferia ou não, requisitando então as informações pretendidas. Caso a
autoridade policial é quem estivesse requerendo, o juiz ainda ouvia o MP antes
de decidir.
Desse modo, o art. 17-B é um dispositivo que trará grande agilidade às
investigações criminais, eliminando o longo e desnecessário tempo de tramitação
deste requerimento em juízo.
A fim de garantir a plena efetividade da nova regra, defendo que, se o
delegado de polícia ou o membro do MP, apesar do art. 17-B, formular pedido ao
juiz para que este requisite tais dados cadastrais, o magistrado não deverá
conhecer do pleito por falta de interesse de agir, salvo se a autoridade
policial ou o Parquet comprovarem que houve recusa no atendimento do
requerimento direto.
Apesar da utilidade do novel dispositivo, poderão ser levantados os
seguintes questionamentos:
Os referidos dados cadastrais estão protegidos por alguma espécie de
sigilo que somente possa ser afastado pelo Poder Judiciário? O acesso aos dados
cadastrais é cláusula de reserva de jurisdição?
A resposta é NÃO. Os dados cadastrais, como endereço, qualificação,
filiação e número de telefone dos investigados não estão abrangidos pelo sigilo
das comunicações telefônicas previsto no inciso XII do art. 5º da CF. Nesse
sentido confira-se os seguintes precedentes do STJ:
(...) Não estão abarcados pelo sigilo fiscal ou bancário os dados
cadastrais (endereço, n.º telefônico e qualificação dos investigados) obtidos
junto ao banco de dados do Serpro. Embargos parcialmente acolhidos, com efeitos
infringentes, para dar parcial provimento ao recurso.
(EDcl no RMS 25.375/PA, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, julgado
em 18/11/2008, DJe 02/02/2009)
(...) frise-se que o inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal
assegura o sigilo das comunicações telefônicas, nas quais, por óbvio, não se
inserem os dados cadastrais do titular de linha de telefone celular. (HC
131.836/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 04/11/2010, DJe
06/04/2011)
Desse modo, entendo que não há qualquer mácula no dispositivo inserido.
Ao contrário, trata-se de previsão racional e consentânea com a necessária
tendência de se desjudicializar diversos procedimentos.
Ressalte-se, contudo, que o dispositivo trata especificamente de dados
cadastrais, não abrangendo os registros telefônicos (chamadas efetuadas e
recebidas). Assim, os registros telefônicos não estão incluídos na autorização
desse artigo.
Uma última observação: entendo que esta previsão do art. 17-B pode ser
estendida para as investigações de outros crimes que não apenas os de lavagem
de dinheiro, sendo comando de caráter geral, não havendo qualquer sentido em se
proibir sua aplicação aos demais delitos.
Art. 17-C. Os encaminhamentos das instituições financeiras e tributárias
em resposta às ordens judiciais de quebra ou transferência de sigilo deverão
ser, sempre que determinado, em meio informático, e apresentados em arquivos
que possibilitem a migração de informações para os autos do processo sem
redigitação.
Comentários:
Imaginemos que o Delegado de Polícia Federal representa ao juiz pela
quebra do sigilo bancários dos últimos cinco anos de três empresas pertencentes
ao investigado.
O juiz defere a quebra e determina às diversas instituições bancárias
nas quais as empresas tinham contas que forneçam as informações à autoridade
policial.
Este Delegado irá receber muitas centenas de documentos e o perito da
Polícia Federal levará vários meses para conseguir ler todas as páginas
enviadas e preparar seu laudo.
Pensando nessa grande dificuldade prática, a Lei, de forma muito sábia,
determinou que as instituições financeiras e tributárias, ao cumprirem as
ordens judiciais de quebra ou transferência de sigilo deverão, sempre que assim
determinado, encaminhar as respostas em meio informático, em arquivos digitais
que possibilitem copiar as informações que tenham nos arquivos para um editor
de texto. Ex: os bancos deverão encaminhar os extratos bancários em formato pdf copiável,
ou seja, pdf que reconheça os caracteres escritos e permita sua cópia.
Trata-se de medida destinada a facilitar o trabalho dos órgãos de
investigação, do Ministério Público e do próprio Poder Judiciário.
De igual modo, aqui também entendo que este art. 17-C deve ser aplicado
para as investigações de outros crimes que não apenas os de lavagem de
dinheiro.
Art. 17-D. Em caso de indiciamento de servidor público, este será
afastado, sem prejuízo de remuneração e demais direitos previstos em lei, até
que o juiz competente autorize, em decisão fundamentada, o seu retorno.
Comentários:
Reputo que esta previsão é inconstitucional.
Indiciamento é o ato do Delegado de Polícia apontando alguém como
possível autor do delito que está sendo investigado, devendo este indiciamento
ser comunicado ao investigado, salvo se estiver ausente injustificadamente,
ocasião em que o indiciamento será indireto.
O CPP menciona a palavra indiciado em alguns momentos. Apesar disso, não
disciplina como deveria ser a formalidade do ato de indiciamento, seus
requisitos etc. Algumas polícias regulamentam internamente as formalidades para
o indiciamento, mas em outros locais, devido à ausência de lei, trata-se de ato
amplamente discricionário da autoridade policial.
Como no inquérito policial, segundo a concepção majoritária, não existe
contraditório nem ampla defesa, a pessoa investigada não sabe, formalmente, de
antemão, que pode vir a ser indiciada não dispondo de qualquer meio de se defender
desse ato ou de tentar refutar esta intenção da autoridade policial.
Vale ressaltar que o Ministério Público não está em nada atrelado ao
indiciamento, podendo, por exemplo, requerer o arquivamento do inquérito
policial em relação à pessoa indiciada pelo delegado, ajuizando a ação penal
contra outro indivíduo que não havia sido indiciado.
O indiciamento, assim, diante de todas essas circunstâncias que o
cercam, sempre teve pouca ou nenhuma relevância jurídica.
Diante da explicação da fragilidade jurídica do ato de indiciamento, é
de se concluir que o afastamento do servidor público unicamente por ele ter
sido indiciado em crime de lavagem de dinheiro é medida completamente
desproporcional e que viola claramente o devido processo legal.
Além do indiciamento ser circunstância extremamente precária, pode
acontecer de o referido servidor possuir um cargo que nada tem a ver com o
suposto crime de lavagem que teria cometido. Logo, seu afastamento geraria
prejuízo ao interesse público até mesmo porque não haveria nenhum risco em ele
continuar trabalhando.
A melhor solução legal seria o juiz, ao receber a denúncia, diante do
pedido expresso do Ministério Público com a demonstração da necessidade,
decidir se seria caso de afastar cautelarmente ou não o servidor público que
fosse acusado de lavagem de dinheiro. Essa foi, aliás, a opção adotada pela Lei
de Drogas (art. 56, § 1º, da Lei n.° 11.343/2006).
Art. 17-E. A Secretaria da Receita Federal do Brasil conservará os dados
fiscais dos contribuintes pelo prazo mínimo de 5 (cinco) anos, contado a partir
do início do exercício seguinte ao da declaração de renda respectiva ou ao do
pagamento do tributo.
Alteração sem tanta relevância para fins de concurso. Pode ser cobrada,
no entanto, a nova redação do dispositivo.
BIBLIOGRAFIA
BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes federais. 7ª ed., Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2011.
BARROS, Marco Antonio de. Lavagem de capitais e obrigações civis
correlatas - com comentários, artigos por artigos, à Lei 9.613/98. 2ª ed.,
São Paulo: Malheiros, 2007.
BRASILEIRO, Renato. Lavagem ou ocultação de bens. Lei 9.613, 03.03.1998.
In: GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches (Coord.). Legislação
Criminal Especial. São Paulo: RT, 2009.
______. Manual de Processo Penal. Vol. 1, Niterói: Impetus,
2012.
MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de dinheiro (Lavagem de
ativos provenientes de crime). Anotações às disposições criminais da Lei n.
9.613/98. 1ª ed., São Paulo: Malheiros. 1999.
MORO, Sérgio Fernando. Crime de lavagem de dinheiro. São
Paulo: Saraiva, 2010.
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais
Comentadas. 5ª ed., São Paulo: RT, 2010.
* Juiz Federal Substituto (TRF da 1ª Região).
Foi Defensor Público, Promotor de Justiça e Procurador do Estado.
Como citar este texto em trabalhos científicos:
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Comentários à Lei n.° 12.683/2012,
que alterou a Lei de Lavagem de Dinheiro. Dizer o Direito. Disponível em:
http://www.dizerodireito.com.br. Acesso em: dd mm aa
Nenhum comentário:
Postar um comentário